O PCP Açores sempre considerou que o turismo constitui uma interessante fonte complementar de riqueza para qualquer território, para além de ser benéfico em termos de trocas culturais entre pessoas de diferentes origens. Mas é um tipo de atividade que encerra muitos riscos, e que deve ser regulamentado de forma a garantir o respeito pelo território, a sua própria sustentabilidade e uma distribuição justa dos valores entre os intervenientes. Não pode ser nunca a atividade económica fundamental de uma região, porque depende no essencial do exterior, e não pode pôr em risco as suas atividades produtivas estruturais.
Com base nestas considerações, o PCP Açores sempre seguiu com atenção as políticas dedicadas ao setor, e juntamente com muitos agentes económicos e associações ambientalistas, esperou que o Programa de Ordenamento Turístico da Região Autónoma dos Açores, o dito POTRAA, saísse da gaveta em que esteve parado durante anos para efeitos de revisão. Chegamos finalmente a saber da sua próxima apresentação ao Plenário da Assembleia Legislativa, depois de cinco anos de vazio legislativo, em que foi autorizada a construção de numerosas unidades hoteleiras.
Em 2019 o turismo nos Açores apresentou indicadores nunca atingidos anteriormente, mas também colocou à vista de todos os enormes problemas que o turismo de massa provoca num território sensível como o nosso. Para além dos reflexos negativos na qualidade de vida dos habitantes, deu origem a um aumento geral dos preços. Viu-se bem, na altura, que este modelo de turismo não enriquece a Região e os seus habitantes, dado que a maior parte dos lucros não ficam aqui, e certamente não nas mãos dos trabalhadores, que pelo contrário sofreram níveis de exploração extrema.
Entretanto, em 2020, veio a pandemia. Os efeitos foram devastadores, e muitos empresários do setor, especialmente os mais pequenos, tiveram de fechar as portas. E agora, em 2022, em consequência da escalada belicista em curso, desenha-se um cenário de recessão cujos contornos ainda se desconhecem, mas que deveria preocupar o Governo tanto quanto preocupa as pessoas comuns, que fazem contas à vida e todos os dias se debatem com a angústia de não saberem como sustentar as suas famílias.
E que proposta para o ordenamento turístico está a ser apresentada? Exatamente a mesma que ficou na gaveta durante anos. Até os valores de referência sobre as quais se baseiam as decisões são os de 2017, e é com esta base que se escolhe o cenário a partir do qual o projeto é elaborado. Entretanto, muitas camas foram já acrescentadas às que existiam.
A proposta define os Açores como «um destino de Turismo de Natureza, […] que exige una contínua ação empenhada na promoção da harmonia e da valorização dos recursos naturais e dos valores humanos». Mas estas boas intenções ficam-se por aqui, porque na realidade abre as portas a atropelos urbanísticos e territoriais, por exemplo através de um que existe sob o Título de Normas Sectoriais, que na prática esvazia de sentido o inteiro Programa, dando cobertura a todos os arbítrios e interesses que possam surgir.
Para o PCP Açores é fundamental que sejam introduzidas alterações, mas as graves deficiências do documento não podem servir de desculpa para mais anos de vazio legislativo, em que são tomadas as decisões sem critério, à custa do bem-estar de todos e do património natural e construído que a todos pertence.