Diferentes e iguais

MAbrantes2Como e porquê atingiu a atual dívida pública portuguesa a sua volumosa, impagável e sempre crescente dimensão?

Envolvendo esta discussão num conveniente tabu sob o pretexto simplório e obscurantista de não provocar ondas nos mercados financeiros, o governo português e a maioria PSD/CDS que o suporta, com a frequente cumplicidade do PS, têm continuamente sabotado o debate parlamentar e institucional questionando a legitimidade dos gigantescos montantes afetos à atual dívida pública portuguesa (praticamente 130% do PIB, cerca de 225 mil milhões de euros, só superada pela Grécia, de entre os países do Euro).

Assim sendo, e reconhecendo que existem diferenças entre a situação portuguesa e a grega no contexto europeu, tais diferenças esbatem-se no entanto quando se olha para as condicionantes que estão por detrás das dificuldades, chantagens e humilhações que tanto o povo português como o povo grego sofreram e continuam a sofrer na pele, bem como para a sua correlação com a monstruosa dimensão da dívida pública de cada um dos dois países, ambos convertidos, através dela, em protetorados de instituições internacionais, como o FMI, o BCE e a Comissão Europeia.

E nada como a diferença entre o tabu português e a abertura que levou à criação, pela presidência do parlamento grego, de uma Comissão Específica (de peritos internacionais) visando analisar a legitimidade da dívida pública grega, para romper com o silêncio imposto ao nosso país sobre as causas profundas das nossas dificuldades.

De acordo com um artigo de Manuel Loff, no jornal Público de dia 20 passado, esta Comissão constatou que o crescimento rápido da dívida pública grega não se deveu em primeiro lugar ao gasto público excessivo, bem inferior aliás, ao de outros países da eurozona, mas antes:

- Ao pagamento de juros muito elevados e até duplicados referentes aos empréstimos da troika, para a Grécia posteriormente pagar (com mais juros) à banca estrangeira. Nada que não se esteja a passar de forma idêntica em Portugal;

- Aos gastos militares. De imediato vêm-nos à memória os submarinos e os carros de combate adquiridos por Portugal;

- À perda de receita fiscal. Pois...tal e qual se passa com os benefícios fiscais à banca e aos grandes grupos sedeados em Portugal;

- À recapitalização pelo Estado da banca privada. Com o BPN, BPP, BCP ou BES não foi isso mesmo que por cá se passou?

- Aos desequilíbrios provocados pelas regras da própria união monetária. Ou não seja também Portugal um país periférico da Europa.

A estas razões comuns há que acrescentar uma outra (portuguesa) bem conhecida e que consiste nos 1,4 mil milhões de euros que o Estado, além do que já pagou, irá pagar em 2015 por encargos assumidos ao abrigo das PPP...

Conforme dados do Banco de Portugal, foram somados mais 663 milhões de euros à dívida pública direta portuguesa desde Dezembro até Abril deste ano. Ou seja, esta dívida impagável, tanto na Grécia como em Portugal, afinal aumenta por tudo menos por causa dos encargos com as pensões, os Serviços de Saúde ou os salários dos trabalhadores do Estado...

E todos lampeiros (como diria Pacheco Pereira), ainda vêm dizer que é preciso "mexer" mais nos impostos e cortar mais nas pensões em 2016...

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 24 de junho de 2015