Um promissor ramo de negócio

Mário AbrantesArtigo de opinião de Mário Abrantes

Quando se entrevista amigavelmente um autarca – Isaltino Morais, condenado a sete anos por fraude fiscal, abuso de poder e corrupção, em horário nobre de um dos canais principais de TV, e logo de seguida no programa da manhã de um outro; quando o 1º ministro do país elogia por duas vezes como grande empresário o foragido Dias Loureiro, que esteve ligado a um processo (BPN) que já surripiou ao investimento público útil mais de 5 mil milhões de euros; quando se coloca sob investigação criminal por suspeitas de enriquecimento ilícito, à custa da política, Marco António Costa, o vice-presidente do principal partido no governo da República; quando se reconduz ao seu lugar um governador do Banco de Portugal comprovadamente lascivo em relação ao buraco do BES que já penhorou o Estado português em 3,9 mil milhões de euros; quando um Presidente da República condecora o empresário Zeinal Bava que comprovadamente lesou uma empresa pública, a PT, em 900 milhões de euros; e tudo isto apenas como amostra dum imenso lastro político/institucional de criminalidade, corrupção e abuso de poder deixado atrás nos anos mais recentes e que até levou um ex-primeiro ministro à cadeia;

Não se está de forma gravosa apenas a considerar estas práticas como toleráveis, ou até mesmo a aceitá-las como um mal menor, ao nível das diversas estruturas institucionais do Estado (Autarquias, Assembleia, Governo e Presidência). Tão ou mais grave ainda é estar-se também de forma induzida a dispensar, senão mesmo a condenar, a honestidade, a seriedade e a ética como componentes inalienáveis e estruturantes, em Democracia, do exercício dos cargos públicos. E está-se finalmente a reduzir as funções do poder político, e do aparelho de Estado por ele administrado, às de um mero intermediário e gestor, quando não promotor, de oportunidades de negócio abertamente favoráveis a grandes interesses particulares. Veja-se, no rol das privatizações, os casos recentes da TAP e da concessão dos transportes públicos, o emblemático caso dos vistos Gold, ou o acelerado crescimento em 2015 das despesas do Estado com as parcerias público-privadas (mais 28%) e com os juros da dívida pública (mais 23%).

Só neste enquadramento assim perverso se compreende que um vice-1º ministro, venha a público, a propósito da recondução do governador do Banco de Portugal, defender, acima de qualquer outra eventual preocupação do poder político, a “estabilidade do sistema financeiro”… Ou que o Presidente da República exercite uma descarada tentativa de usar o cargo para manipular o eleitorado, afirmando que as eleições de 2015 “terão” de garantir uma maioria absoluta capaz de, mau grado os resultados desastrosos para o povo e o país, dar continuidade às atuais políticas e compromissos do Estado com o directório europeu e os grandes grupos económicos e financeiros.

Só neste enquadramento assim perverso se torna compreensível a insistência no corte continuado das pensões como forma, dizem, de garantir a sustentabilidade da Segurança Social. São 3 milhões de portugueses a sustentar o sistema, descontando todos os meses dinheiro vivo e fresco em grandes quantidades, para onde naturalmente os olhos vorazes do capital financeiro se viram agora. Nada como desacreditar este sistema e diminuir a pressão para a sua defesa, utilizar esses dinheiros para fins diversos (Bolsa ou outras despesas do Estado) ou instituir o plafonamento, desviando os descontos para o sector privado.

Mas tudo isto não é administrar o Estado, nem prover o bem comum. É um cancro que se desenvolveu na Democracia, que não se cura com paliativos e que, através da acção interventiva, da insistente denúncia e do voto livre dos cidadãos, urge erradicar…