Pregar no deserto?

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Mário AbrantesEnquanto a Região se afunda, com o País, na diminuição da riqueza produzida e no aumento da pobreza, da desproteção social e do desemprego, pelos quais, aliás, ambos muito se condoem, prossegue imparável, fugindo ao essencial, a acérrima campanha do inútil entre figurões do PS e do PSD:
Se os encargos futuros com as SCUT e o Hospital da Terceira são de mais ou menos seiscentos milhões de euros; se as dívidas da saúde são para diminuir ou aumentar este ano; se a subida (superiormente descurada) do desemprego é culpa do governo regional ou do governo da república, enfim, se o PS será melhor ou pior do que o PSD…a semear precisamente a mesma desgraça!

E o que é “a mesma desgraça”? Lamentar com lágrimas de crocodilo os cortes e os sacrifícios impostos sobretudo às pessoas de mais baixa condição e às que trabalham, (fazendo lembrar as insónias de que se queixava Teixeira dos Santos por ter de aplicar os PEC’s), e carregar a fundo na austeridade para, segundo afirmam ambos, pagar uma dívida e conter um défice, demonstrando-se contudo logo de seguida, por via das estatísticas, a sua total incapacidade de conter a despesa pública e aumentar as respetivas receitas, seja nos Açores ou no País…Isto é, a sua total incapacidade para, depois de ordenados e executados os sacrifícios sob seu comando, conseguirem demonstrar, pelos resultados, a necessidade e a utilidade dos ditos. E aqui para nós, nem poderia ser de outra forma. Dessa mesma incapacidade (também com lágrimas de crocodilo, diga-se) o presidente do Eurogrupo, Jean Claude Juncker, e o chefe do FMI para a Grécia, Paul Thomsen, deram conta, referindo-se à errada prioridade dada pela Zona Euro ao problema financeiro, menosprezando o crescimento económico, no programa troikista para a Grécia…
Consumidores com pensões e salários cortados, cortes nas prestações sociais e subsídios de desemprego (só 32,5 % dos desempregados recebem subsídio nos Açores), a levantar poupanças, e uma banca cada vez mais insolvente e pouco atreita a emprestar, significam, como diria Craig Roberts, diretor do Instituto para a Política Económica (Oakland, EUA): “Nenhumas condições portanto para o crescimento económico!”.
Quando é que, mais troikistas que a troika, os nossos deuses caseiros das campanhas do inútil se irão dar conta disso também? E dos desnecessários sofrimentos por eles impostos e irreversíveis, quem irá ressarcir os sofredores?
Podendo, de momento, parecer pregar no deserto, sobressaem meritórias algumas pedradas no charco das ideias deste barranco de cegos pelo poder. Refiro-me às propostas de sinal contrário, que os troikistas laranja ou rosa inviabilizaram, vindas recentemente da bancada do PCP no parlamento açoriano e visando a devolução do subsídio de férias e de natal aos trabalhadores da administração pública regional. Refiro-me à petição pelo aumento de 5 para 7,5% do acréscimo regional ao salário mínimo nacional. Refiro-me ainda à proposta que veio a público, pela mão do economista Célio Teves, e que outros de alguma forma já antes defenderam sem que ninguém os ouvisse, da criação de um Banco Público de Investimentos nos Açores.
Destas propostas se retira que, garantindo por um lado poder de compra mínimo a uma parte importante da população, e, por outro, condições não leoninas de empréstimo bancário, ficaria na prática assegurado um mercado fundamental para os milhares de pequenas e médias empresas ou empresários que constituem o grosso do nosso frágil tecido económico...

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 29 de março de 2012