Opinião

MAbrantes2"Não é com os que atiraram Portugal ao fundo que o país encontrará solução", frase chave que da Festa do Avante no passado fim de semana ecoou por todo o país. Efetivamente assim é, e os dados mais recentes reconfirmam Portugal como tendo tido um dos piores desempenhos económicos dos últimos cinco anos de entre todos os países da União Europeia (cálculo obtido a partir da AMECO, uma base de dados económicos e financeiros da própria UE). O falso beco sem saída onde nos encurralaram os partidos da troika, juntamente com os tratados europeus e a moeda única, necessita com urgência de ser contornado (e pode sê-lo) sob risco da eternização do predomínio de políticas injustas de austeridade, privações e empobrecimento, bem como dum futuro incerto e sem esperança para a esmagadora maioria dos portugueses.

A União Económica e Monetária, o Tratado Orçamental e a Governação Económica da UE constituem uma espessa barreira aos caminhos e às alternativas que os cidadãos e o desenvolvimento económico e social reclamam e esperam. O que proporcionaram até hoje foi a destruição do nosso aparelho produtivo, semearam desemprego e transformaram Portugal, por via das sucessivas privatizações de setores estratégicos, levadas a cabo ora pelos governos do PS ora pelos governos do PSD (com ou sem a muleta do CDS), num exportador líquido de capitais para os países mais desenvolvidos da UE.

Entrando em clara oposição aos desideratos daqueles que "atiraram Portugal ao fundo", colocam-se portanto, além de outras questões essenciais para garantir o desenvolvimento do país e o revigoramento das autonomias regionais, a necessidade urgente de renegociar a dívida pública, de recuperar instrumentos de soberania monetária, cambial, orçamental e fiscal, assim como a preparação para, em caso de necessidade, uma eventual saída do Euro, de preferência articulada e negociada com outros Estados e a própria UEM. Não podemos é ser daqueles que em nome da manutenção na moeda única estão dispostos a sacrificar até ao último salário, à última pensão ou reforma, até ao último serviço público...

"Os que atiraram Portugal ao fundo" propõem-se manter, no que é essencial, uma política de assalto aos rendimentos dos trabalhadores e reformados, de penalização fiscal destes e de não tributação do grande capital, de consolidação orçamental à custa dos salários e direitos sociais.

Uma outra perspetiva é aquela que visa promover a produção nacional e assegurar a justiça social através do aumento da produção, do aumento do investimento público, do apoio às PME, do controlo pelo Estado de empresas estratégicas, da reforma da PAC (por exemplo instituindo o plafonamento da produção leiteira para defender o rendimento dos produtores), da reforma da Política Comum de Pescas, de uma nova política fiscal (em que quem ganha menos, paga menos, e quem ganha mais, paga mais), da valorização dos salários e pensões, e da tributação do grande capital.

Para além de todo o fumo de diversão lançado ao ar pela intromissão a destempo, em geral pouco inocente, de dezenas de candidaturas presidenciais, a opção fundamental que se coloca em 4 de Outubro aos eleitores portugueses, não é escolher entre PS ou PSD/CDS, entre Costa ou Passos, enfileirando em bipolarizações artificialmente sustentadas, é antes escolher entre os que "atiraram Portugal ao fundo" ou os que, sem ocultar as dificuldades, se colocam à disposição do seu povo e do seu país para construir um caminho diferente, económica e socialmente mais justo no futuro.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 10 de setembro de 2015

MAbrantes2Com uma inusitada frequência a comunicação social portuguesa tem-nos atirado aos olhos e ouvidos a história do "empate técnico" entre o PS e a PaF (PSD mais CDS) como resultado de múltiplas sondagens realizadas a partir das mais diversas fontes.

É costume dizer-se que as sondagens valem o que valem, mas cada vez mais elas valem menos como termómetros que refletem a vontade do eleitorado e valem mais como instrumentos de condicionamento (e manipulação) subliminar do voto dos eleitores.

Ora na situação presente a história do "empate técnico" serve às mil maravilhas os dois empatados e portanto, de acordo com a ideia acima e dado o elevado grau de dependência da maioria dos órgãos da comunicação social relativamente ao interesse comum dos empatados, tenderá a repetir-se com alguma regularidade, mesmo que outras sondagens (as não públicas) apontem para resultados depois de 4 de Outubro que se venham a afastar consideravelmente de tal empate...

E então vejamos de que diferentes modos a farsa e o engodo do "empate técnico" propiciam a ocultação dos verdadeiros interesses em causa nas próximas eleições e servem os objetivos eleitorais não só do PSD e CDS, como também do PS:

- O "empate técnico" entre a coligação PaF e o PS permite escamotear subliminarmente uma previsível e clara derrota dos partidos da direita no poder, já que PSD e CDS juntos apresentam na generalidade das sondagens um número de votos em média muitíssimo mais baixo (33 a 38%) que a soma por eles obtida em 2011 (mais de 50%);

- Com a ajuda do "empate técnico", esconde-se que a votação é para deputados e não para primeiros-ministros e dá-se relevância a um despique personalizado a dois em que se estimula o eleitorado a utilizar predominantemente critérios clubísticos, ou critérios de oratória e boa aparência, para uma escolha que acaba sendo redutora, limitada a duas hipóteses (bipolarização) e onde, para além de se agitar pela rama a maior ou menor seriedade ou competência de um ou de outro, a política propriamente dita acaba completamente menorizada como fator de decisão;

- Com o "empate técnico" fabrica-se a ideia que tanto o PS como o PSD/CDS poderão vencer por pouca margem, logo, todos os votos, incluindo os repescados dos restantes concorrentes, vão ser precisos para que o inferno não ganhe ao céu. Vá-se lá saber, na cabeça de cada um, qual dos dois é o céu ou se o inferno passou a ser azul, já que os programas eleitorais, para além de algumas diferenças de gradiente, são muito semelhantes;

E assim se procura através das sondagens, esvaziar as diferentes alternativas e puxar pelas maiorias absolutas sejam elas do PS ou do PSD/CDS (nunca de outros, está bem de ver...), tão desejáveis para Cavaco e Silva como para a elite dos banqueiros, bem como ainda para que as políticas a executar durante o mandato se possam afastar substancialmente das prometidas ao eleitorado sem que com isso seja beliscada a sacrossanta "estabilidade governativa"...

Quanto mais não seja, bastaria esta simples constatação para, em nome dos interesses do povo e do país, e da diminuição da instabilidade social (semeada de forma violenta e continuada nos últimos anos), ser de toda a utilidade que, depois de 4 de Outubro, não venham a existir maiorias absolutas de qualquer partido ou coligação concorrente ao parlamento português e que cresçam em número de votos e de deputados as forças que podem fazer a diferença (política) com vista à indispensável mudança de rumo do país.

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 3 de setembro de 2015

MAbrantes2"É preciso avisar toda a gente, dar notícias, informar prevenir, que por cada flor estrangulada, há milhões de sementes a florir", cantavam Luis Cília ou o Padre Francisco Fanhais, alimentando a alma de um povo humilhado e semeando a revolta, quando ainda poucos acreditavam que o fim do regime fascista pudesse estar próximo.
Hoje uma seita de imberbes e toscos capatazes do neo-liberalismo europeu que se apossaram do poder em Portugal voltaram, como diria Rui Namorado, a apertar com cinismo o pescoço ao povo. Gente capaz de cometer a mais torpe e miserável patifaria e qualificá-la de seguida como uma obra política meritória.
Torna-se por isso imperioso usar novamente a força do poema para alertar toda a gente, dar notícias, informar, prevenir contra esta outra gente.
Gente capaz de criar 640 mil desempregados, mais 260 mil inativos e mais 250 mil subempregados entre os 4,8 milhões de portugueses em idade ativa;
Gente capaz de mandar para a emigração as maiores vagas de sempre, 120 mil emigrantes em 2012, outros tantos em 2013 e mais 110 mil em 2014;
Gente capaz de pôr um em cada cinco trabalhadores a ganhar o salário mínimo, num crescendo de 73% desde 2011;
Gente capaz de desinvestir na saúde e semear o caos nas urgências, provocando o aumento da mortalidade em 11% só entre Julho de 2014 e Julho de 2015;
Gente capaz de pôr 48 mil cidadãos a comer todos os dias em cantinas sociais e pôr quase dois milhões a viver no limiar da pobreza;
Gente capaz de pôr 656 mil cidadãos a passar por caloteiros por deixarem de conseguir pagar a prestação da casa;
Gente capaz de endividar o país ao ritmo de mais 43 milhões de euros por dia, só no 1º semestre de 2015;
Gente capaz de entregar todo o sector estratégico da economia portuguesa a interesses privados externos, nalguns casos ao preço da chuva, noutros, já em fim de mandato, às três pancadas e em modo de saque, como a TAP ou agora o metro e os STCP do Porto;
Gente capaz de assumir, à revelia dos portugueses, múltiplos compromissos com a UE que conduziram ao empobrecimento geral, tal como aquele outro que assumiram já sem mandato para 2016, propondo-se cortar mais 300 milhões de euros na prestação de serviços públicos e mais 600 milhões nas reformas e pensões;
Gente desta, capaz de fazer o que tem feito ao longo dos últimos anos, não deveria ter direito a gozar férias descansada e muito menos pretender ganhar eleições...
E o poema prossegue, "É preciso avisar toda a gente, segredar a palavra e a senha, engrossando a verdade corrente, duma força que nada detenha"...

 

Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 27 de agosto de 2015

Mário AbrantesArtigo de opinião de Mário Abrantes

Já praticamente morta por desgaste informativo, a guerra dos cartazes (outdoors), que funcionou como mais uma batalha político-informativa aleatória para empolar artificialmente a bipolarização entre PSD/CDS e PS (como outras que ainda estão para vir até dia 4 de Outubro), suscita duas questões, essas sim importantes, em meu entender:

- Mal vai quem, para publicitar as suas “verdades”, tem necessidade de recorrer a pessoas “falsas”. Mesmo depois de retirados os cartazes polémicos, aos seus promotores fica por essa via indelevelmente associada a mentira política como arma de propaganda, isto é, a mentira como instrumento de conquista do poder;

- A comunicação social e os comentadores de serviço de forma acrítica alimentaram até mais não esta disputa estéril, deixando de lado questões tão sérias como o simples levantar do véu aos rios de dinheiro que alguns, não todos, gastam em material de propaganda eleitoral do género dos outdoors.

MAbrantes2Mais do que centrar as atenções na acusação ou condenação dos responsáveis pelo recuo dramático na interpretação da vontade democraticamente expressa pelo povo grego (através de referendo) de condenação do programa de austeridade de cariz impositivo e pró-colonialista imposto pelas instituições europeias, torna-se necessário tirar alguns ensinamentos do que tem acontecido com a Grécia e a UE.
O primeiro e útil ensinamento a tirar é o de que em todo este processo ficou desmascarada a profunda falsidade dos princípios da solidariedade, da coesão e do progresso social em que desde há décadas se vem dizendo que assenta esta Europa que nos têm vendido e que nos habituámos a "engolir" de forma muitas vezes acrítica. Ficou perfeitamente à vista a sua natureza anti-democrática, anti-social, ofensiva da independência e dignidade das nações e dos povos, e bloqueadora do desenvolvimento harmónico.
O segundo ensinamento é de que se tornou indisfarçável no seio desta Europa, com caráter deliberativo de facto e para lá das instituições formais como o Eurogrupo, a Comissão, o Conselho ou o Parlamento Europeu, o domínio de um ou dois países economicamente mais fortes (em particular da Alemanha e França), constituídos em diretório de comando, conjuntamente com o BCE e o FMI.
O terceiro ensinamento consiste na evidência da ligação profunda deste diretório aos interesses da oligarquia financeira transnacional, fazendo uso preferencial da submissão à moeda única e do chicote chantagista da dívida pública para, em particular sobre os países (e estados) económica e financeiramente mais débeis da União, agravar a exploração no mundo do trabalho, promover a apropriação progressiva pelo setor privado transnacional de todo o património público, económico e produtivo estratégico dos países endividados, e aumentar a concentração monopolista e capitalista, provocando o agravamento das desigualdades a todos os níveis.
O quarto ensinamento é o de que qualquer tentativa de romper com este status quo de domínio e sufoco do interesse dos povos e nações da UE, como aquela que sucedeu na Grécia, representa uma batalha desigual e extremamente difícil por se desenrolar perante uma correlação de forças muito favorável aos dominadores e aos interesses instalados, que conseguem mesmo atrair para o seu lado os dirigentes de algumas das suas próprias vítimas (como foi o vergonhoso caso do governo português). Mas nem por isso, a iniciativa solitária mas determinada de apenas uma nação e um povo, deixou de fazer tremer esta Europa. E nem por isso deixaram de quebrar-se os tabus da impossibilidade de qualquer dos países do Eurogrupo poder vir a renegociar as suas dívidas impagáveis ou sair da moeda única, encarando esta última inclusivamente com sentido libertador.
A 16 de Março de 1974 uma tentativa de levantamento militar foi derrotada pelo regime fascista, mas tal derrota não fez mais que acelerar o processo conducente a outro levantamento militar, desta vez vitorioso, que ocorreu um mês depois em 25 de Abril. O quinto ensinamento é assim a história que nos traz, e diz-nos simplesmente que adiante de batalhas perdidas, especialmente quando as causas são justas e o povo nelas se envolve, poderá estar a vitória na guerra.
A renegociação da dívida pública portuguesa e o debate sério com vista à libertação das grilhetas impostas pela moeda única nem são tabu nem estão fora de calendário. Disso depende em grande parte um futuro com perspectivas e condições de vida dignas, com democracia, liberdade e justiça social...
Artigo de opinião de Mário Abrantes, publicado em 16 de julho de 2015

Subcategorias